16.1.22

COMO FILTRAR OVERLOAD DE INFORMAÇÕES NA INTERNET



COMO FILTRAR OVERLOAD DE INFORMAÇÕES NA INTERNET?:

Fake News em tempo de pandemia (e eleições também) ou mantenha a calma e não siga o Coelho Branco


Raniere Menezes


O que é Overload de informação?

Information Overload é um conceito utilizado para definir um estado de sobrecarga de informação. Que também é definido às vezes como Síndrome da Fadiga por Informação (IFS). Ou seja, uma quantidade de informações que simplesmente não pode ser processada completamente por uma ou mais pessoas; é um caos; é como alguém despejar um caminhão de informação por segundo em seu aplicativo de mensagens. E quando você junta esta quantidade de informação com as táticas de engenharia social para gerar tráfego, compartilhamentos e likes, através de conteúdos, narrativas falas e sensacionalistas, nasce o casamento de um par nada romântico de Overload e Clikbait, diria que é quase o encontro de Arlequina e o Coringa em Arkhan.


O Clickbait é quem produz conteúdo com objetivo de caçar-cliques, e atua como uma isca para fisgar seu clique. No meio desta combinação que torna nosso dia mais poluído de informações, muitas vezes apenas encaminhamos e compartilhamos conteúdos sem filtro. E neste tsunami de informações o que não falta são teorias da conspiração. E combater fake news é como querer apagar milhares de focos de incêndios numa floresta com um extintor. É inútil, cansativo e tedioso. 


Necessidade de filtro

O que podemos fazer é tentar filtrar melhor e melhorar o nível de informação que chega a cada um de nós. E este alerta está em seu nível máximo de 2020 para cá em 2022. E não adianta filtrar através de agência de checagem e jornalismo em geral, grande ou pequena mídia (não há neutralidade!). O maior trabalho de filtragem é pessoal, individual, de cada um... e isso dá trabalho! E por dar trabalho, muita gente não tá mais nem aí se está consumido caminhões de narrativas falsas ou não, simplesmente se transformou em mero expectador.


Este ano em especial, 2022, teremos um ano que vai somar “pós-pandemia+crises+eleições+overload de informações”, uma tempestade perfeita para um cenário de asilo. As teorias da conspiração estão chegando com uma grande onda. Mas alguém vai gritar: “E se for verdade?”.  -- Se na teoria da conspiração tiver verdades misturadas, não deixa de ser mentira? Se tiver mentiras, é perda de tempo, e você estará lutando contra moinhos imaginários. Ninguém numa guerra real quer tá alucinado atirando na própria sombra e nos aliados. Um exemplo prático: se eu tenho nove notícias falsas relacionadas a uma cadeia de eventos verdadeiros, o quanto de verdade eu tenho? Meia verdade continua verdade?


É preciso ter um discernimento razoável para ser eficiente em combate real, é exatamente isto que precisamos para enfrentar a campanha eleitoral 2022. Perceba o vocabulário de guerra: “Campanha”; “público-alvo” e “false flag”. Um exemplo de false flag nas eleições de 2018, quem não se lembra da jovem da suástica riscada no corpo perto das eleições? A propaganda eleitoral foi uma das mais sujas da história e 2022 promete! Geralmente, uma campanha política se iniciava em menos de um ano, agora são quatro anos em campanha permanente, sendo que a cada ano os níveis de ataques sobem. Se existe uma tempestade se aproximando, é esta. Nos EUA não conseguiram conter as cataratas de teorias da conspiração, imagina como será no Brasil em 2022. Vale a pena entender rapidamente o que aconteceu nos EUA de 2017 a 2020, no tocante (como diz Bolsonaro) às eleições do Trump, para ao menos realizarmos uma comparação e evitar algumas armadilhas.


Por que somos atraídos por teorias da conspiração?


Michael Barkun classificou as teorias da conspiração em três tipos:


Teorias de conspiração de eventos. Isso se refere a eventos limitados e bem definidos. Os exemplos podem incluir teorias de conspirações como o assassinato de Kennedy ou o 11 de setembro.


Teorias da conspiração sistêmica. Acredita-se que a conspiração tenha objetivos amplos, geralmente concebidos para garantir o controle de um país, região ou mesmo do mundo inteiro. Os objetivos são amplos, enquanto o maquinário conspiratório é geralmente simples: uma única organização implementa um plano para se infiltrar e subverter as instituições existentes. Esse é um cenário comum nas teorias da conspiração que se concentram nas supostas maquinações de judeus, maçons, comunismo ou igreja católica.


Teorias da superconspiração. Para Barkun, essas teorias vinculam várias supostas conspirações hierarquicamente. No cume há uma força maligna distante, mas todo-poderosa. Exemplo: o Anticristo.


Nestas três categorias ainda se discute os níveis de sigilo, ações secretas e discretas. A internet hoje é um servidor gigante de informações de baixo custo e acessível por bilhões de pessoas. Não tem fim especulações conspiracionistas e opiniões sem noção. Todos os campos das ideias e desenvolvimentos intelectuais hoje estão na Internet, esta inclusão tem tecnicamente o potencial de dar voz a qualquer pessoa, do mais medíocre aos mais preparados, incluem pessoas más, negativas, maliciosas, oportunistas e também pessoas que querem contribuir verdadeiramente para o bem comum. 


Teorias gringas que podem ser recicladas por aqui

A narrativa NOM (Nova Ordem Mundial) tem várias versões e fusões bem disseminadas e estabelecidas, algumas quase canônicas. E quem não concorda com alguns pontos canônicos pode ser cancelado, logo será taxado de aliado do sistema da NOM ou considerado alienado. Críticas a parte, um certo ceticismo é saudável ou podemos começar a estocar arroz em garrafa pet debaixo da cama. Por pura “sorte” ou providência divina o Brasil não embarcará em teorias da conspiração nas eleições 2022. Filtrar totalmente o volume de desinformação é impossível, por aqui nem precisa intervenção hacker dos russos, pois temos a maior usina de memes do mundo. Talvez este abuso em fabricar memes o Brasil não tenha em seu DNA a tendência de acreditar nas pessoas, parece que o Brasil é um dos campeões em desconfiança. Os políticos que comem pastel de feira de quatro em quatro anos não enganam ninguém. Tenho impressão que a “tia do zap” e o “tio do pavê” ao receberem uma carrada de fake news misturada com notícias verdadeiras, como uma feijoada, no fundo sabe que não é verdade, mas se prejudica o adversário político encaminha e compartilha sem pena. Esta prática aconteceu nos EUA e não deu certo para os eleitores do Trump.


Os adversários do Trump foram meses acusados ininterruptamente dos crimes mais escandalosos da história. Contra Trump, defendia a narrativa, seus adversários considerados o Deep State (o Estado Profundo) realizavam planos secretos, -- tão secretos que vazavam em fóruns conspiratórios de um estado não tão profundo. – O que parece estranho para nós no hemisfério sul, para eles foi algo bem real. Alguém já disse que a relação das teorias da conspiração com as pessoas é como um border collie entendiado encontrar uma criança hiperativa sem supervisão de adultos.




Muita gente surtou com estas narrativas nos EUA, este mergulho em narrativas fundiu satanismo, pedofilia, canibalismo, tráfico sexual, túneis e submundos do crime; que havia uma rede internacional de famosos e poderosos envolvidos, que o Soros, Obama e os Clintons seriam presos, e que o Trump seria a peça-chave que iria desmascarar todo mal dos globalistas. No final desses acontecimentos famosos e poderosos seriam presos numa prisão de segurança máxima e levados para um tribunal internacional. 


Este movimento, com esta crença se tornou forte e com muitos seguidores, denominado movimento QAnon. – Algumas ideias respingaram por aqui e fizeram conexão com personagens do Brasil e América Latina, como por exemplo vincular o envolvimento do ditador da Venezuela, Maduro, da Bolívia, Evo, do crime organizado do tráfico de drogas do México e da América do Sul, com o tráfico humano sexual, conectado a grupos de criminosos nos EUA e supostos envolvimentos com políticos, bilionários, famosos americanos, famílias poderosas, elementos da maçonaria e Illuminati. Neste quebra-cabeça narrativo é possível conectar políticos da esquerda da América Latina e militares como o ex-general venezuelano chavista Hugo Armando Carvajal, que promete desvendar as entranhas da política da América Latina. 


Esta montagem interminável desse quebra-cabeça, peça por peça, migalha por migalha, pista por pista fez surgir linguagens enigmáticas do movimento QAnon, como por exemplo, “siga o coelho branco” ou “tome a pílula vermelha”, esta referente ao filme Matrix e seguir o coelho uma alusão a estória de Alice no país das maravilhas. Na ficção do livro de Lewis Carroll, seguir o Coelho Branco parece ser uma metáfora para ir atrás do conhecimento e da verdadeira sabedoria. Mesmo diante dos maiores obstáculos, Alice continua procurando por ele no País das Maravilhas, como se quisesse aprender mais. A pílula vermelha e a pílula azul representam a escolha entre reconhecer a verdade ou negar, são elementos metafóricos da ficção Matrix. Hoje temos mais condições de analisar crossovers de teorias.




Estas narrativas foram disseminadas nas redes sociais e fóruns em sites para participações de pessoas anônimas. De modo geral, este movimento ganhou o nome de QAnon (“Q”: um significado misterioso de um usuário anônimo de fóruns que postava informações supostamente secretas de Estado e “Anon” de anônimo) e se popularizou.   Fóruns em sites fortaleceram esta ideia por meses, eu acompanhei de perto alguns fóruns e conheço pessoas que praticamente surtaram com essas narrativas, ao ponto de abandonarem suas rotinas de trabalho para entrar de cabeça no que seria o maior escândalo de todos os tempos, algo que ia parar o mundo e fazer do 11 de setembro café pequeno. 


O movimento cresceu muito até o momento que o Trump perdeu a disputa presidência dos EUA em 2020. Um dos lemas do QAnon era: “ONDE FOR UM, VAMOS TODOS NÓS”. Em campanha eleitoral o movimento cresceu muito e parecia imbatível. Quanto mais se aproximava das eleições de 2020 a adesão dos seguidores do Trump aumentava e expectativas de uma grande operação estava para acontecer (tic-tac), a Operação STORM ou Tempestade ou Grande Despertar era a ordem do dia. Nos fórum as pessoas estavam relatando visões de batalha espiritual entre anjos e demônios. O sincretismo de narrativas intensificava conforme a aproximação das eleições. O movimento se fortaleceu especialmente nas mídias digitais e nas vendas de produtos em e-commerce. E pensar que tudo isso começou com uma história numa pizzaria (pesquisar no Google: Pizzagate QAnom para entender toda trama) e envolveu uma campanha presidencial nos EUA. Nunca uma narrativa envolveu tanta gente nos EUA desde a Guerra dos Mundos (série antológica de rádio-teatro estadunidense) em 1938, transmitido pela rede de rádio do Columbia Broadcasting System, dirigido e narrado pelo ator e cineasta Orson Welles, que causou pânico nos ouvintes com notícias de uma invasão alienígena na Terra.




O Trump em algumas entrevistas, ainda presidente, usava linguagem enigmática e os caçadores de pistas enlouqueciam, pois havia uma expectativa crescente sobre a operação Storm. O Trump do nada fazia referencia que antes da tempestade havia calma e aliados do governo tuitavam: Tic-tac. Os fóruns vibravam (cada usuário dava uma opinião mais estranha do que outra) e a bola de neve das narrativas ficava cada dia maior. Vi muita gente misturar aos comentários elementos bíblicos, apocalípticos de batalha espiritual, inutilmente, fantasiosamente. De tudo que produziram e divulgaram não alteraram em nada os acontecimentos atuais. Cada um que dava uma pista para seguir o coelho, mas não havia um coelho branco, mas milhares de coelhos, cada um em uma direção. O que era tomar uma pílula vermelha acabou em overdose de ilusões.


Especialmente a política (e a pandemia foi politizada), ao longo dos séculos, sempre trabalhou com mecanismo de propaganda e contrainformação. A desinformação foi amplamente usada por pessoas mal intencionadas para prejudicar outras pessoas, um caso clássico de uso de novas mídias/comunicação, temos, por exemplo, uma estratégia panfletaria política de 1903, de um texto chamado Protocolos de Sião, um texto antissemita que descreve um suposto projeto de conspiração por parte dos judeus para dominar o mundo através da destruição do mundo ocidental. Parece que o mesmo conceito é aplicado atualmente sobre famílias bilionárias no esquema NOM.


Michael Barkun definiu teorias da conspiração como parte de conhecimentos não validados como verdade por instituições que confiamos. Porém, o relativismo e subjetivismo estão tão fortes em nossa sociedade que não confiamos mais em instituições que antes confiávamos mais naturalmente. Isto também se deve ao fato da transformação das informações. Quem acredita hoje na neutralidade e imparcialidade da Imprensa? Quem acredita na supremacia da ciência? 


Quais lições podemos extrair em tempos de pandemia e eleições no Brasil?

A primeira lição certamente é desconfiar quando alguém diz ter informações top secret de bastidores e corredores palacianos. Desconfie. Desde a quarentena da OMS em 2020 temos um grande contágio de desinformação e não adianta confiar imediatamente em checadores de fatos nem no jornalismo, não existe neutralidade e imparcialidade, muitas agências de checagens de notícias pertencem a grupos de mídia e jornalismo. Desconfie de checadores, verifique pessoalmente, faça pesquisa, compare. Quem checa os checadores? Estão criando um Ministério da Verdade (do livro: 1984), como se já não bastasse a censura produzidas pelas big techs e determinações da justiça. É uma situação bem complicada confiar nos censores. Liberdade de expressão pode ser interpretada como terrorismo verbal por censores. Filtrar e buscar boas fontes ainda são o modo mais prudente ao receber sobrecarga de informações.




Outro exemplo para ficar alerta é não entrar no clima de “já ganhou”. Disparar, compartilhar mais fake news do que o adversário não garante vantagem, alguns discordam e consideram que vale a pena entrar numa guerra suja e fazer o mesmo jogo sujo. Há proveitos eleitorais em entrar na guerra suja e fazer o mesmo jogo? Para o Trump não houve, ele aumentou sua munição contra Hillary Clinton, Biden e Obama, mas não adiantou. -- Os democratas estudaram amargamente a derrota de 2016 e trabalharam “silenciosamente” como fez a Cambridge Analytica em 2016, mineraram os eleitores, analisaram dados com comunicação estratégica para o processo eleitoral. -- E não adianta reclamar se teve fraude ou não, o que vale na prática é que o Trump perdeu a cadeira. É importante lembrar que a maioria dos apoiadores estava no clima do já ganhou. Numa campanha um eleitor motivado conquistar um voto de outra pessoa vale mais que acelerar a fábrica de narrativas. O poder está nos dados. Os algoritmos devem ser analisados para ter vantagem real sobre os caras que dão as cartas no jogo.


Teorias conspiratórias têm elementos em comum e seu poder estar em confundir, enganar, misturar verdade com inverdades, fique atento aos principais elementos:

-- o bem contra o mal.

-- um grupo poderoso em disputa de poder e controle.

--- Armadilha utópica (prometem uma nova era em troca de algo valioso).

-- Só um grupo seleto de iluminados-despertos conhece a verdade. -- GERALMENTE em busca de explicações e interpretações de padrões há uma tendência para decifrar ou decodificar sinais e eventos como algo mau e correntemente é sempre um grupo de visionários iluminados que descobre um plano obscuro ou oculto. Teorias da conspiração são tentativas de interpretações de padrões e explicações geralmente “revelacionais” de algo oculto.


Perceber os métodos da engenharia social já desloca a perspectiva de expectador em pessoa crítica. 


Outras lições finais são os 4 Ds:

Desconfie de mensagens sensacionalistas.

Desconfie de caçadores de likes.

Desconfie de mensagens enigmáticas.

Desconfie de narrativas que você tem que montar um quebra cabeça pra entender, mesmo que você ache uma história incrível.


Conclusão

Estes princípios resumidos servem tanto para informação/desinformação relacionados à pandemia quanto para eleições. A prudência e observação são virtudes, ser precipitado em compartilhar conteúdos na Internet muitas vezes serve apenas para a intenção do produtor da narrativa. Cuidado com comparações radicalizadas, geralmente uma associação de um acontecimento atual com algum fato marcante da história tem que ser bem fundamentado, não compartilhe apenas porque a narrativa é impactante. A verdade muitas vezes incomoda quando contraria seu entendimento, mas deve sempre prevalecer. Nada que esteja encoberto ficará para sempre velado. Nada contra a verdade senão a verdade. Não é merecedor de honra insistir em espalhar mentiras, apesar das boas intenções, mesmo que o conteúdo tenha a intenção de combater a manipulação e controle social. Como assim? É possível trabalhar com engenharia social, criar uma narrativa falsa para combater algo ruim. Eticamente devemos evitar tanto o primeiro mal quanto o segundo. As mídias mudam, mas as mensagens falsas têm o mesmo DNA.